O final do século 18 e o início do século 19 foram períodos de deslocamentos forçados nas Terras Altas da Escócia. Grandes proprietários, em busca de lucro e da preservação da própria riqueza, expulsaram com violência cerca de 150 mil pessoas das terras onde viviam há gerações. Para quem quiser saber mais sobre as clearances, Limpezas das Terras Altas, há ampla bibliografia disponível.
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Em 1826, dentre os expulsos da área de South Lochs, em Lewis, estavam os ancestrais de Mary Anne MacLeod, nascida em 1912. A Primeira Guerra Mundial e um naufrágio que traria os homens daquela ilha de volta para casa agravaram a pobreza. Mesmo que a família de Mary Anne tivesse uma situação econômica um pouco melhor que a da maioria dos vizinhos, ela seguiu os passos das irmãs mais velhas e, em 1930, aos 18 anos de idade, emigrou para os Estados Unidos, onde trabalhou como babá e viveu até junho de 1934.
Voltou para a Escócia, com intenção e autorização de regressar aos EUA, o que fez naquele mesmo ano. Em 1936 se casou com um descendente de alemães e passou a se chamar Mary Anne MacLeod Trump. 25 anos depois de sua morte, um dos filhos do casal, Donald Trump, tomou posse como presidente dos Estados Unidos pela segunda vez em 20 de janeiro de 2025. Em seu discurso de posse, enfatizou:
“Primeiro, vou declarar emergência nacional na nossa fronteira com o México, no sul. Todas as entradas ilegais serão imediatamente interrompidas e vamos começar o processo de deportação de milhões e milhões de estrangeiros criminosos para os lugares de onde vieram. Restabeleceremos minha política de ‘permanecer no México’.”
“Além disso, ao invocar a Lei de Inimigos Estrangeiros de 1798, vou direcionar nosso governo a usar todo o poder de aplicação das leis federais e estaduais para eliminar a presença de todas as gangues estrangeiras e redes criminosas que trazem crimes devastadores para o solo dos EUA, nossas cidades e centros urbanos.”
“Como presidente, não tenho responsabilidade maior do que defender nosso país de ameaças e invasões, e é exatamente isso que farei. Faremos isso em um nível que ninguém jamais viu antes.”
Em 23 e 24 de janeiro, a porta-voz da Casa Branca anunciou pelas redes sociais que 538 imigrantes em situação irregular haviam sido presos desde a posse de Trump e que centenas deles já haviam sido deportados em aeronaves militares, dando início à maior operação de deportação em massa da história. “Promise made. Promise kept.”
Na noite de sábado (25), pousou no aeroporto de Confins, na região de Belo Horizonte, avião da FAB com 88 brasileiros deportados dos EUA. Eles estavam no grupo de 158 pessoas que saiu de Alexandria, no estado da Virgínia, em um avião militar americano que fez escala no Panamá e pousou em Manaus, quando aconteceu a mudança de aeronave.
O início do século 21 tem sido um período de deslocamentos forçados em quase todo o mundo. Políticas migratórias restritivas, conflitos armados, perseguições políticas, raciais, religiosas, desastres ambientais, disputas por recursos naturais, violações de direitos humanos.
Somos testemunhas. Até sermos nós mesmos os deslocados. E, se depender de Trump, não teremos o final feliz de Mary Anne.
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