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Na Cidade de Gaza, uma paisagem de ruínas, em cena cuidadosamente coreografada, combatentes armados do Hamas transferiram reféns israelenses à Cruz Vermelha. Na Salah Al Deen, a via que corta a Faixa de Gaza desde Khan Younis até o campo de Jabalia, uma multidão retornou para o norte –a pé, em carroças ou carros– até suas casas que já não existem. As imagens do interregno propiciado pelo cessar-fogo situam-se numa encruzilhada histórica que definirá os destinos de Israel e da Palestina.

Há duas soluções para Gaza. A primeira, que deve ser descrita como solução de paz, é a retirada completa das tropas de Israel e a substituição do governo do Hamas por uma administração da Autoridade Palestina sustentada por forças árabes e internacionais.

No fim da linha, sob o manto de um acordo regional de segurança entre Israel e os países árabes, a Faixa de Gaza e a Cisjordânia seriam reunificadas num Estado Palestino independente. Biden e Blink delinearam tal plano, que tem o apoio de sauditas, egípcios e jordanianos, mas nunca utilizaram o poder dos EUA para impô-lo ao governo extremista de Netanyahu.

“Joe genocida” –a acusação infamante ressoou nas manifestações de jovens universitários nos EUA, junto com as bandeiras e palavras de ordem de uma esquerda que, sob os efeitos da amnésia histórica, clama pela destruição do Estado judeu. No lugar de Joe, tem-se agora Donald, um líder extremista capaz de associar a noção de paz à de limpeza étnica.

A segunda solução para Gaza é a de Trump, expressa no verbo “esvaziar” e no objeto “local de demolição”. O presidente dos EUA dirigiu ao Egito e à Jordânia a proposta de transferir os 2,1 milhões de palestinos de Gaza para campos “temporários” ou “de longo prazo” nos dois vizinhos de Israel. Pela primeira vez, um governo americano alinha-se às correntes supremacistas israelenses que, hipocritamente, pregam a “migração voluntária” da população do enclave, na rota da anexação do conjunto da Terra Santa.

São mais que palavras. Diante da previsível rejeição, Trump dobrou a aposta: “espero que [o presidente egípcio] Sissi absorva alguns. Nós os ajudamos bastante e tenho certeza de que eles nos ajudariam. Ele é meu amigo –e acho que o rei da Jordânia também faria isto.” O pretexto para a retomada da guerra está ali, no centro arruinado da Cidade de Gaza, sob a forma dos combatentes do Hamas, que enxergam os palestinos comuns como “mártires da causa”.

A “solução final” de Trump colocaria a derradeira pá de cal na visão da partilha da Terra Santa em dois Estados consagrada na célebre resolução da ONU de 1947. Os palestinos seriam confinados a campos fragmentários de refugiados e convertidos, para sempre, num povo sem expressão estatal. Paralelamente, surgiria um grande Israel governado por nacionalistas e religiosos fanáticos engajados na repressão militar-policial de árabes destituídos. A destruição da Palestina conduziria, inevitavelmente, à implosão da democracia israelense.

O “Eixo da Resistência” iraniano, uma coalizão de milícias antissemitas, está morto. A constelação de governos autoritários árabes do Oriente Médio não tem a força ou a convicção para barrar a solução de Trump. Resta saber se a sociedade israelense será capaz de interromper a marcha rumo à catástrofe.


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