Circula pela internet há alguns dias um print de um famoso influenciador brasileiro na área financeira prevendo o colapso da economia chinesa. Poderia ser de 2024, mas o vídeo em questão tem sete anos. A anedota é comum —volta e meia algum analista prevê uma catástrofe, uma bolha prestes a estourar e declara uma crise proporções inigualáveis para o país asiático.
Sob o risco de também virar chacota daqui a cinco ou dez anos com previsões furadas, argumento que talvez tenha chegado a hora de levar as ameaças mais a sério desta vez.
Sabemos que desde a reabertura pós-Covid zero, Pequim tem enfrentado problemas difíceis de reverter no curto prazo. O mercado imobiliário, pilar do crescimento chinês e até pouco tempo responsável por 29% do seu PIB, dá sinais de arrefecimento claro. Os preços de casas e apartamentos, outrora usados por chineses como porto seguro de suas economias, vêm caindo paulatinamente, e incorporadoras como a Country Garden e a Evergrande se afundaram em dívidas.
Sem o setor como alternativa, o mercado acionário também balança. O índice SSE Composite, que agrupa as principais empresas listadas na bolsa de Xangai, recuou 15% no ano passado. As taxas de formação de capital fixo bateram 42% em 2023, acima da média mundial de 25%, mas a eficiência do investimento fraqueja (4,4% de retorno em 2024, comparados aos 8,9% de 2010). Somam-se a isso a crise demográfica, a queda de produtividade desde 2021 e a alta taxa de desocupação juvenil —e estamos diante de uma tempestade perfeita.
Os dados são de um relatório publicado nesta semana por Stewart Paterson, da Fundação Hinrich de Singapura. O mote do estudo não poderia ser mais aterrador: a economia chinesa, ele argumenta, encaminha-se para um cenário muito semelhante ao da “década perdida” japonesa, quando investimentos excessivos e política estatal intervencionista deram lugar a um período longo de estagnação do qual o país nunca se recuperou completamente.
Em ambos os casos, políticos apostaram em um modelo de crescimento baseado na alta taxa de investimentos financiados por crédito estatal, que impulsionou o setor industrial e imobiliário. No Japão, esse modelo levou a uma bolha especulativa insustentável e depois ao crescimento anêmico que perdurou por décadas.
O desafio em Pequim é encontrar um caminho para sustentar o crescimento sem agravar os desequilíbrios. A transição para um modelo mais baseado no consumo interno e menos dependente de investimentos excessivos exigiria reformas estruturais custosas como alterar a rede de seguridade social, reduzir a interferência estatal em empresas e permitir maior liberalização.
China, terra do meio
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O sistema político vigente, porém, limita a margem de manobra, e a resposta têm vindo por meio de custosos pacotes de incentivos que perpetuam a sobrevida de setores improdutivos. Enquanto isso, postergam-se decisões cruciais, aumentando o risco de uma crise nunca evitada, apenas adiada.
A China provou por 40 anos que apostar contra a perspicácia da sua liderança é uma péssima ideia. Mesmo sob tantos problemas, ainda conseguiram entregar o prometido crescimento de 5% no ano passado e ainda têm fichas para queimar antes de tocar em tabus políticos. O problema é que, quanto mais o tempo passa, mais cresce a sensação de exaurimento do que funcionou até aqui.
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