No final de agosto de 1978, numa célebre entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Cacá Diegues lançou a expressão “patrulhas ideológicas” para se referir a uma orquestração crítica que atuaria para cercear determinadas vertentes e produções culturais.
O diretor sentia-se atingido àquela altura pelo que definiu como “um sistema de pressão, abstrato, um sistema de cobrança”. Seria, em suas palavras, uma tentativa de codificar toda manifestação cultural brasileira. “Tudo o que escapa a essa codificação será necessariamente patrulhado.”
A reação do cineasta vinha na esteira de alguns ataques ao filme “Xica da Silva”, sucesso de público, acusado de racismo e de ser concessivo com convenções comerciais. Seu alvo eram setores da esquerda que, de um lado, se mostravam incomodados com o suposto distanciamento de artistas da pauta nacional-popular ou que, de outro, cobravam uma atuação mais radical no plano das linguagens e da relação com o mercado.
Naquele período, com a relativa descompressão política e a crise que começava a sacudir o regime militar, o pacto tácito de uma frente ampla anti-ditadura ia se quebrando e as divergências tornavam-se menos silenciosas no campo progressista.
Reanimavam-se, dez anos depois, os embates que haviam sido travados por ocasião do tropicalismo, vaiado pela esquerda universitária por sua perspectiva internacionalista e aberta à cultura de massas.
Também entrava em cena uma multifacetada geração estudantil que trazia discussões acirradas –notadamente entre os partidários dos cânones tradicionais do Partido Comunista e os defensores de posições mais heterodoxas, desejantes e experimentais em cultura e comportamento.
Cacá foi um intelectual progressista e um intelectual específico do cinema brasileiro. Democrático e humanista, comprometido –como sua geração– com ideais de um Brasil emancipado, criativo e inclusivo, militou nos Centros Populares de Cultura (CPC) no início da década de 1960, participou da formulação do cinema novo e a seguir das estratégias de ampliação de público que se colocaram mais explicitamente na década de 1970.
Nos embates de sua rica trajetória, apanhou um pouco de todas as patrulhas, foi reconhecido internacionalmente e nos deixou um legado que ficará simbolizado por seu imprescindível “Bye Bye Brasil”.