Embora o Instituto Nacional do Seguro Social tenha a guarda de dados pessoais, financeiros e sensíveis dos brasileiros, atualmente ele é incapaz de preservá-los em sigilo. E não é nem por muito tempo. Quando um segurado se aposenta no INSS, em questões de minutos, no mesmo dia que o benefício começa a valer, vários bancos já descobrem quem se aposentou, qual sua renda, seu endereço e seu número do celular. Inicia-se uma disputa concorrencial entre os bancos para ver quem consegue primeiro persuadir o novo aposentado a se endividar via empréstimo consignado.
Essa foi a conclusão ao menos formada por juízes da terceira turma recursal da Justiça Federal do Ceará que condenou em mais de R$ 24 mil o INSS e mais três bancos por dano moral em razão do vazamento de dados e pelo assédio instantâneo logo depois da aposentadoria. Os bancos não conseguiram explicar como tiveram acesso aos dados pessoais. E o INSS tem negado neste, e noutros casos, qualquer tipo de vazamento de dados. Tudo isso não evitou a condenação.
A circunstância de o vazamento de dados ter ocorrido minutos após a aposentadoria, e para vários bancos, é prova inequívoca da vulnerabilidade e da corrupção na autarquia.
Os procedimentos concessórios de benefícios previdenciários não são publicizados ou divulgados em algum portal de transparência. Quem deseja se aposentar, dar entrada no Meu INSS usando senha, inclusive com biometria facial. Caso o pedido seja aceito, a informação é restrita ao interessado. Até são reveladas estatísticas de novos aposentados, mas sem identificação pessoal.
Na decisão do processo 0007938-48.2022.4.05.8100, o juiz Nagibe de Melo Jorge Neto analisou o caso de aposentada que, após alguns minutos da referida concessão do benefício, começou a receber uma enxurrada de mensagens e ligações telefônicas em seu celular, referente a convites para realização de empréstimos consignáveis. Como a quantidade de ligação era tão grande, a aposentada desligou o celular durante o trabalho.
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A indenização por danos morais foi justificada por violação dos direitos fundamentais à segurança, à privacidade e à proteção de dados, além dos transtornos pessoais advindos da obstinada e insistente recorrência do assédio dos bancos, com perturbações significativas não só sobre rotinas individuais, familiares, sociais e laborais, como também sobre períodos de descanso.
Essa imediatidade dos bancos em descobrir quem se aposentou é sinal da rentabilidade da indústria do vazamento de dados. Bancos privados e públicos compactuam dessa situação, além de ilicitamente extraírem dados do INSS. Um mercado rentável se aperfeiçoa todos os meses nessa migração ilícita de informações sigilosas.
O próprio juiz apontou que o INSS tem como descobrir esta ilicitude, pois “dispõe de ferramentas tecnológicas para demonstrar que não teria ocorrido qualquer tipo de vazamento de dados ou mesmo qual ou quais servidores acessaram os dados do beneficiário “Meu INSS” no período e, assim, investigar de que forma se deu o inequívoco vazamento de dados para instituições financeiras”. Parece que sai mais barato para o INSS pagar condenações isoladas do que tomar providências para resolver este assunto de vez.
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