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Nos últimos anos, o debate sobre política monetária no Brasil tem sido marcado por pressões para flexibilizar o regime de metas de inflação, especialmente em momentos de dificuldades fiscais.

Recentemente, assistimos ao início de uma discussão sobre a possibilidade de o Banco Central utilizar o intervalo de tolerância da meta para acomodar temporariamente uma inflação mais alta ou até mesmo aceitar o topo da banda como meta. Com os agentes econômicos discutindo a possibilidade de estarmos próximos de um regime de dominância fiscal —situação na qual a política monetária torna-se limitada ou ineficaz para controlar a inflação—, alguns argumentam que mirar uma meta muito baixa poderia, na prática, agravar esse cenário, uma vez que os juros teriam de ficar altos por um período mais prolongado, levando a uma trajetória de dívida/PIB insustentável.

Essa ideia, porém, é um erro grave. Flexibilizar a meta de inflação não resolve os desafios econômicos do país. Pelo contrário, há um agravamento, com perda de credibilidade do BC, elevação dos prêmios de risco e, no limite, aumento dos juros de médio e longo prazo. O efeito é perverso: em vez de aliviar a situação fiscal, o endividamento público fica mais caro, tornando imprescindível um ajuste fiscal ainda mais significativo.

Duas condições costumam aproximar um país de um quadro de dominância fiscal: um BC hesitante no combate à inflação e um governo que não garante a sustentabilidade da dívida pública. Em vários casos, apenas essa segunda condição já é suficiente para que a dominância fiscalocorra.

Embora a inflação no Brasil esteja acima da meta e o processo de desancoragem das expectativas de inflação esteja em curso há bastante tempo, o BC tem atuado de forma coerente com as regras monetárias usuais, sem demonstrar, até o momento, dúvidas sobre o seu compromisso com o controle da inflação e com o centro da meta. Contudo, se, a partir de agora, começar a mirar o teto do intervalo de tolerância (ainda que não explicitamente), a chance de comprometer sua credibilidade será grande. A interpretação do mercado seria inequívoca de que a meta de inflação teria mudado e de que haveria “licença para gastar”.

Os intervalos de tolerância existem para oferecer flexibilidade ao BC em situações em que não é possível manter a inflação exatamente no centro da meta, devido a choques externos —como uma alta dos preços das commodities, por exemplo. Em outras palavras, na construção do regime de metas, o intervalo não foi pensado para acomodar os efeitos inflacionários de uma política fiscal não crível.

Outro equívoco é achar que há atalhos para controlar a inflação. Não é a meta de inflação que determina o nível da Selic. A política monetária pode ser expansionista, contracionista ou neutra, dependendo da taxa de juros real neutra da economia (taxa de juros entendida como a de equilíbrio), que, por sua vez, é influenciada por fatores como a política fiscal, a produtividade da economia e as condições globais —não pela meta de inflação.

Embora a situação fiscal do Brasil seja preocupante e exija ajustes, o país ainda tem instrumentos para controlar sua dívida sem precisar recorrer a um regime de inflação mais alta. Se só houvesse essa saída, aí sim já estaríamos em dominância fiscal.

A política monetária tem um papel claro: garantir a estabilidade dos preços. Já a política fiscal deve ser conduzida de forma a garantir a solvência da dívida pública. Misturar os dois é uma receita para o desastre.


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