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Existem muitas razões para se pensar que a realidade cultural e política do Equador tem pouco a ver com a brasileira. Pensamento equivocado.

E não é que ouço isso com frequência? Quando vou para o país andino a trabalho, um dos dois únicos com os quais o Brasil não faz fronteira (o outro é o Chile), normalmente as perguntas são: “qual o interesse de vocês no que acontece aqui?”; “o que tem de importante neste país nanico?”; “que papel jogamos na geopolítica regional?”; “temos algo em comum?”.

E, por fim, claro, “qual dos dois países tem a melhor banana?”. Cada uma dessas perguntas tem uma resposta. E não me alongo muito aqui sobre as circunstâncias políticas e econômicas do momento porque minha colega Mayara Paixão fez um retrato impecável da situação do país em suas matérias.

Os benefícios de enviar um repórter em viagem são outros. Estão nas minúcias que enriquecem qualquer cobertura. Pode-se encontrar uma Quito pacífica, em que o centro histórico está cheio de mochileiros e em que você pode pedir para andar na réplica do elevador do Titanic, que está no restaurante Vista Hermosa e ter uma vista sensacional da Basílica dos tempos coloniais. Ou conhecer a “rua das sete cruzes” e aí ter uma ideia de como o poderio católico se impõe sobre as tribos pré-colombianas. Sete igrejas se levantaram numa mesma rua. Também pode-se sair chamuscado pelos fogaréus armados pelos indígenas quando estes decidem descer das serras para protestar por melhores condições de vida.

A essa altura já sabemos que haverá um segundo turno entre o direitista Daniel Noboa e a apadrinhada de Rafael Correa, Luisa González.

Mas sem um olhar legitimamente interessado, é fácil que o Brasil pose de esnobe, ignorando internacionalmente trabalhos como o do artista Oswaldo Guayasamín, ou de escritores como Gabriela Alemán, nascida no Rio de Janeiro quase que por acidente, mas que conhece o Paraguai, onde viveu, e o Equador, onde está radicada, como a palma de sua mão.

Para quem pensava que Quito era uma aldeia indígena, ela transpira como uma metrópole nas alturas, guiada por seu artista mais famoso, o artista gráfico Xavier Bonilla, famoso por enfrentar Rafael Correa na Justiça na época da falta de liberdade de expressão do país.

Mas quem disse que os brasileiros nunca viram isso? Os mais especiais, sim. E veja bem qual deles. Nada menos que João Cabral de Melo Neto, que tem agora lançado no Equador uma seleção de seus “poemas ecuatorianos”.

Neles, João Cabral, enviado para ser diplomata entre 1979 e 1981, viu semelhanças nos traços dos trabalhadores que vinham trabalhar nas alturas dos Andes. A caatinga, o sertão, sua aridez, não lhe soavam como pouco familiares à vista do interior do Equador. Os vulcões o inebriaram, e descreveu vários deles. Não como uma paisagem alienígena, mas como de nossa terra, ou da grande nossa terra que poderia ter sido caso os sonhos de Simon Bolívar pudessem ter se tornado realidade.

No mar, afogamento, nos Andes, asfixia, ambas obrigando o homem americano a se adaptar. Não fugiu aos olhos do poeta a enorme desigualdade social e étnica, ainda um tema no Equador, que aqui e ali vive protestos por conta disso, assim como as condições do que chama em seus poemas de “indígena-formiga”.

Quanto à banana, cada uma com seu gosto, mas na minha modesta opinião, as equatorianas ganham de 10 a 0 das brasileiras.


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