O filme “Emilia Pérez” foi do céu ao inferno em poucos dias. Indicado em 13 categorias do Oscar, deve sair com as mãos quase vazias pelas projeções dos especialistas. Como, então, uma obra que só perde em indicações para “A Malvada” (1950), “Titanic” (1997) e “Lala Land” (2016) passou da possível consagração ao fiasco? Os concorrentes são tão melhores? Os responsáveis estavam todos doidões ao apontarem tantas qualidades ao trabalho final de Jacques Audiard?
Emilia Pérez era favorito e aclamado pela crítica até o cancelamento de Karla Sofia Gascón. Quem ousava dizer que não gostava, fazia de forma quase envergonhada, com muitas tergiversações. Quando a atriz principal se torna um pária, ficaram todos à vontade para dizer que o filme é uma porcaria, que não sabem como recebeu tantas indicações. Sem falar da turma “não vi, não gostei”.
Há quem aponte que o problema é que os mexicanos detestaram o filme. O problema é que a imprensa destacou a reação negativa nas redes sociais como se fosse unanimidade nacional. Parecem se esquecer que as discussões nessas plataformas são um fragmento do debate e que declarações polêmicas e discurso de ódio são impulsionados pelos algoritmos desde sempre. Mas é uma bobagem bancar que Emilia Perez ofende todo um povo, inclusive porque o que não falta nas redes é gente ofendida.
Claro que qualquer trabalho artístico toca as pessoas de maneira diversa. O body horror de “A Substância” não agrada a muitos, mas não é desprezado como Emilia Pérez passou a ser. O filme de Audiard vem sendo atacado exatamente pelos méritos que têm.
É estereotipado, extravagante, grotesco, inovador e transforma a tragédia social dos milhares de desaparecidos num musical, que trata da mesma forma a mudança de gênero, a violência contra mulher, corrupção e narcoestado. Por tudo isso pode causar imenso desconforto ao expectador que acredita que esses temas só podem ser tratados de forma cartesiana.
Mas a desgraça de Emilia Pérez veio mesmo com o cancelamento de Gascón, abandonada pelo público que festejou o sucesso e a indicação de uma mulher trans a vários prêmios, pelos colegas de elenco, pelo diretor e possivelmente pelos críticos responsáveis pela avalanche de indicações ao Oscar.
Particularmente, achei sua atuação apenas mediana e seu papel coadjuvante, diferentemente do que foi alardeado. A grande estrela é Zoe Saldaña, que talvez seja a responsável por ganhar um dos únicos prêmios para o filme.
O ponto principal é que se os jurados do Oscar sucumbiram ao histerismo da opinião pública, que já condenou Gascón ao exílio social, e deixaram de avaliar Emilia Pérez pelo que é como obra cinematográfica, quem perde é a arte.
Se o filme protagonizar o fracasso que se anuncia na noite da premiação, há de se questionar se suas 13 indicações não foram mera sinalização de virtude dos membros da Academia, que usaram Sofia Karla, uma mulher trans, para provar que a indústria é inclusiva.
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