Minha geração cresceu aprendendo a identificar os norte-americanos, aos quais nos referíamos como “ianques”, a agentes do “capitalismo”. Não é, portanto, sem assombro que vemos agora Donald Trump, o líder ianque, desferindo facadas em dois dos mais fundamentais princípios do “capitalismo”, que são a especialização do trabalho e a utilização de vantagens comparativas.
Ao impor tarifas a produtos estrangeiros, Trump desliga mecanismos que vêm historicamente permitindo a consumidores obter produtos cada vez melhores e mais baratos. Isso ocorre não só porque a tecnologia avança mas também porque as coisas são fabricadas de forma mais eficiente por quem consegue fazer mais gastando menos. Se os EUA “exportaram” alguns bons empregos para países com vantagens como salários menores, o troco veio pelo barateamento de vários itens, de comida e eletrodomésticos a peças de vestuário.
Nos cálculos de Deirdre McCloskey, ao longo dos últimos dois séculos, graças a esses processos, o habitante médio do planeta viu sua riqueza multiplicar-se por 10, chegando a 30 nos países desenvolvidos. As tarifas, se mantidas, privarão os consumidores ianques de ao menos parte dessa bonança material. Vamos ver como eles reagirão a isso.
Se existe alguma teoria por trás das ações de Trump, é aquela economia intuitiva tão falsa como uma nota de três dólares. Por ela, a rota para enriquecer é não ter déficits comerciais com ninguém, só superávits. No mundo real, isso é uma receita para o desastre. Eu, por exemplo, mantenho um enorme déficit com o supermercado perto de casa. E acho ótimo. Se eu tivesse de plantar e abater tudo aquilo que minha família consome no jantar, morreríamos de fome.
Trump não é tão burro. O mais provável que não se guie por nenhuma teoria econômica, mas apenas siga seus impulsos oportunistas. Enquanto plantar o caos lhe trouxer vantagens políticas, ele o fará. Quando deixar de obter resultados, ele, à maneira dos populistas, inventará uma mentira e tentará outro caminho.
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