Cada caso é um caso. Abro mão de saber as intenções do autor e vou ao texto. Se a coisa for um panfleto escancarado, dispenso. Prefiro se for um texto bem resolvido com suas camadas políticas.
Affonso traz outra perspectiva num papo publicado pelo jornal Rascunho em 2003. “Toda poesia boa é engajada, porque ela está dizendo alguma coisa que interessa, bate na alma do leitor. Ainda que seja sobre amor, sobre algo aparentemente vago, seja sobre a morte —pode haver nisto engajamentos”.
Reconhecia esse engajamento que extrapola as questões políticas, mas não topava qualquer coisa. Sabia: a forma —do poema e, acrescento, de qualquer texto literário — é crucial. Apenas boas intenções não bastam.
Na ocasião, citou um de seus trabalhos mais famosos. “Um poema como ‘Que País é Este?’ publicado no Jornal do Brasil, em 1980, sendo engajado, você há de convir, é também um poema de alto rigor formal”. Naqueles versos, lemos:
“Uma coisa é um país,/ outra um ajuntamento.// Uma coisa é um país,/ outra um regimento.// Uma coisa é um país,/ outra o confinamento.// Mas já soube datas, guerras, estátuas/ usei caderno ‘Avante’/ — e desfilei de tênis para o ditador./ Vinha de um ‘berço esplêndido’ para um ‘futuro radioso’/ e éramos maiores em tudo/ — discursando rios e pretensão.// Uma coisa é um país,/ outra um fingimento”.
Poucos anos depois, em 2006, o autor voltou a lembrar como escritores, sobretudo os mais novos, devem ir além das vontades na hora de compor sua literatura. O papo, na ocasião, foi no Paiol Literário.