Assim, é mau-caratismo abjeto ou idiotia robusta essa conversa de que não se podem punir aqueles que “apenas tentaram” romper o estado de direito ou dar um golpe de estado, dado que, resta evidente, a lei pune justamente a tentativa. Reconheço, infelizmente, o risco de que os idiotas dominem o mundo não em razão de sua capacidade, mas do tamanho da sua grei, como observou Nelson Rodrigues. E, convenham, o rebanho dos velhacos também não é nada é desprezível.
MAS HOUVE “TENTATIVA”?
Li um artigo de um desses patifes que andam disfarçados de inquiridores das contradições do pensamento democrático — nunca lhes ocorre apontar as indignidades dos reacionários (adivinhem que lado estão…) — tentando alargar um inexistente hiato entre aqueles que atacaram as respectivas sedes dos Três Poderes no dia 8 de janeiro e as figuras graúdas que, articuladas numa organização criminosa, tentaram o rompimento violento do estado de direito e a deposição do governo legitimamente eleito.
Não havia hiato nenhum. As mensagens trocadas pelo general Mário Fernandes com Mauro Cid e outros golpistas evidenciam que controlavam os acampamentos, os bloqueios nas estradas e até a “mobilização do agro”. O ataque na Praça dos Três Poderes, com efeito, não era o principal objetivo da orquestração, como resta evidente. Era a última e desesperada cartada. Todo o resto, até ali, havia falhado.
As “tentativas” do Ministério da Defesa, por intermédio do agora indiciado general Paulo Sérgio Nogueira, de intimidar o TSE não buscavam fortalecer o sistema de votação; objetivavam vulnerar o tribunal, atacando a sua credibilidade e instilando dúvidas entre os eleitores, o que poderia, por óbvio, facilitar um eventual golpe antes da eleição.
A propósito: o então presidente da República liderou uma reunião no dia 5 de julho de 2022, em que se bate o martelo: a intervenção no processo aconteceria antes do pleito. O custo de uma ação posterior seria muito alto, com o que concordam Mário Fernandes — o do plano homicida de agora —, Augusto Heleno e o próprio Bolsonaro. A máquina do Estado era, pois, mobilizada para impedir a realização da eleição: tentativa de golpe de estado; tentativa de abolição do estado de direito; organização com propósito criminoso.
Vocês já conhecem, a esta altura, a sequência de eventos. Bolsonaro recebe Fernandes no dia 8 de dezembro de 2022; rompe o silêncio no dia 9 e anuncia que não deixará o poder, dando a entender que algo acontecerá; o general “kid preto” imprime o plano homicida no próprio Palácio do Planalto; o próprio presidente apresenta aos comandantes das Forças Armadas a minuta do golpe; faz-se a campanha para sequestrar Alexandre — sempre em conexão com os acampados — etc.