O governo federal vem apontando que poderá adotar medidas para tentar reduzir o preço dos alimentos. De fato, a alta desses produtos foi expressiva em 2024: a cesta básica, que é composta principalmente de alimentos e bebidas, subiu quase 10% no ano passado, após ter registrado variação negativa de 4% em 2023 (dados da Abras). E novas altas estão a caminho, uma vez que o repasse para o varejo das pressões no atacado não é instantâneo, ocorrendo com alguma defasagem.
Parte dessa elevação dos preços dos alimentos no Brasil adveio de movimentos internacionais: o índice de preços de commodities alimentícias e de bebidas do FMI (Fundo Monetário Internacional) acumulou alta de pouco mais de 4% até novembro (leitura mais recente disponível), em dólares norte-americanos.
Outra parte dessa pressão decorreu de fatores climáticos, particularmente a ocorrência do fenômeno El Niño, entre meados de 2023 e meados de 2024. Foi o El Niño mais intenso desde 2015/16 e ele acabou contribuindo, dentre outros fatores, para a queda de 7% da safra de grãos brasileira no ano passado. Segundo estimativas da LCA 4intelligence, esse fenômeno respondeu por cerca 2,3 pontos percentuais da alta de 8,2% da inflação de alimentação no domicílio em 2024 captada pelo IPCA/IBGE.
Mas o principal fator por detrás desse encarecimento dos alimentos foi a expressiva desvalorização do real ante o dólar ao longo de 2024, de cerca de 24%. Boa parte dos alimentos são produtos transacionáveis internacionalmente, de modo que alterações na taxa de câmbio acabam sendo transmitidas, em boa medida, para os preços domésticos desses produtos.
O que irá acontecer em 2025 com os preços dos alimentos? Há algumas notícias alvissareiras, como a expectativa de alta de cerca de 10% da safra de grãos doméstica e um clima mais próximo da neutralidade ou com um La Niña fraco. Por outro lado, em razão de um ciclo típico do segmento, o preço da carne bovina deverá subir expressivamente neste ano.
No final das contas, o principal fator a determinar a dinâmica dos preços dos alimentos será a evolução da cotação cambial. As projeções de consenso mais recentes indicam que o dólar deverá encerrar este ano em torno de R$ 6, o que representaria uma certa estabilidade ante o patamar do último bimestre do ano passado. Assim, não atrapalharia mais, mas também não ajudaria.
À luz do que foi exposto acima, o que o governo federal poderia fazer? Eu começo apontando aquilo que ele não deveria fazer: introduzir desonerações tributárias. Ao gerar impacto negativo sobre as contas públicas, em um momento no qual necessitamos melhorar ainda mais os resultados fiscais, esse tipo de política pode ser contraproducente, pressionando ainda mais a cotação cambial.
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Ademais, não é nem um pouco garantido que reduções de impostos serão repassadas para os consumidores: a experiência prática brasileira mostra que, no passado, desonerações aumentaram a margem da indústria e do comércio, não chegando à ponta final.
Portanto, a melhor forma de aliviar o preço dos alimentos é por meio de uma política econômica coerente, que levasse o dólar de volta para as cercanias de R$ 5,50 a R$ 5,60, devolvendo cerca de metade da alta observada no ano passado (a outra metade se deveu a fatores internacionais, fora de nosso controle). Para obter isso, o governo teria de se comprometer a entregar algum superávit primário ainda em 2025.
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