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Quando Trump afirma que vai expulsar mais de 2 milhões de palestinos de suas terras e transformar a Faixa de Gaza na Riviera do Oriente Médio está sendo autoritário, irresponsável, criminoso, mas sobretudo cruel. Dizer a pessoas que perderam pais, filhas, amigos, casas, empregos e a perspectiva de um futuro que serão exiladas para milionários do mundo todo se bronzearem e tomarem gin tônica em Clubs Med construídos, literalmente, sobre os cadáveres de seus entes queridos é um escárnio –e é isso mesmo que pretende ser. Gasolina no fogo. Sangue no rio de piranhas. É Trump agitando o Coliseu das redes, unindo seu exército de admiradores no gozo com o sofrimento alheio.

Segundo reportagem da Folha, na última terça (11), um estudo de Berkley mostrou que o discurso de ódio no Twitter cresceu 50% desde que Elon Musk o comprou e o transformou em X. O próprio comprador ajudou a engrossar o caldo, semana passada, ao postar que havia passado o fim de semana “enfiando a Usaid” —agência americana de auxílio humanitário para o exterior— “no triturador de madeira”. Isso é um deboche com gente morrendo de Aids em Botswana e Lesoto, com famílias de hondurenhos e nicaraguenses desabrigados por furacões, sem falar dos mais de 10 mil funcionários da agência que aguardam ter seus empregos triturados a qualquer momento. O tuíte não é sobre a eficiência do governo. Não é Hayek nem Mises. É Goebbels e Calígula.

Embora a direita seja mais eficiente na administração da crueldade, não detém o seu monopólio. De maneira menos pragmática e menos abrangente, mas igualmente perversa, a esquerda contribui para a tragédia climática dos humores. Basta um “erro”, um “deslize”, uma discordância do protocolo politicamente correto da semana e, sob a desculpa esfarrapada da “justiça” ou da “reparação”, hostes partem pra cima do “infiel”, os smartphones e teclados dos computadores em riste, feito tochas e foices. O sadismo com que essa turba ataca os “hereges” não difere do de Trump falando do seu projeto de Gaza-o-Lago nem de Musk triturando a ajuda humanitária. No fundo, é só o prazer de fazer o mal.

A bruxa está solta –e não é só nas redes. Em São Paulo, dois ladrões numa moto matam o ciclista para roubar um celular. Pouco mais tarde, baleiam outro, por mais um telefone. No Rio, o motorista de Uber dá um chute nas costas e nocauteia a senhora que derrubou farelo de biscoito em seu carro. Os PMs jogam o cara da ponte.

Em Minas Gerais, em 2016, um jovem de 19 anos desafiou os candidatos interessados no apoio dos 10 mil membros da sua organização, a Direita Minas, a aparecerem em público com camisetas de Brilhante Ustra. Ustra era especialista em torturar pais e mães diante dos filhos e vice-versa. Uma vez, levou uma menina de 5 anos para ver a mãe, destroçada, no calabouço. A menina perguntou: “Mamãe, por que você tá verde”. Em 2022, esse jovem chamado Nikolas Ferreira foi o deputado federal mais votado do Brasil, hasteando as bandeiras do cristianismo e da defesa da família. Existe algo menos cristão e que agrida mais a família do que torturar filhos diante dos pais?

Se vivo fosse, depois de publicar “A Era das Revoluções”, “A Era dos Impérios”, “A Era do Capital” e “A Era dos Extremos”, acho que Eric Hobsbawm iria escrever “A Era da Maldade”. Sorte a dele, morreu antes de o mundo ir pro brejo.


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