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Eram 10:06 da manhã quando posamos para uma foto perto do marco do “Trópico de Capricórnio”, em Ubatuba, litoral de São Paulo. O tempo estava nublado e um pequeno avião sobrevoava a praia do Cruzeiro naquele dia nove de janeiro.

Nós seguimos com o olhar o trajeto de dois minutos de descida, quando a aeronave tocou o solo da pista do aeroporto de Ubatuba. O avião seguia reto na pista, mas a velocidade não diminuía. Eu pensava: “quando ele vai parar? Ele precisa parar, mas não parou”. Queríamos ver o pouso de longe mas a realidade foi outra.

Ele cruzou o alambrado, atravessou a pista, explodiu na praça e, depois, caiu na areia da praia. Tudo isso a poucos metros de nós. Foram segundos que nos deixaram congeladas de medo.

Estava com minha irmã Juliana e minha sobrinha Julia, de sete anos. Ambas moram em Ubatuba. Eu havia chegado na cidade na quarta para descansar uns dias.

Só depois que o avião explodiu e a fumaça preta subiu é que conseguimos correr para a rua que vai em direção ao shopping da cidade. Corríamos tanto que, quando nos demos conta, estávamos na frente do shopping, cerca de 200 metros depois. Minha sobrinha chorava e eu pedia calma.

O Corpo de Bombeiros fica ao lado do aeroporto e as viaturas chegaram bem rápido ao local. Mas o impacto nos fez acreditar que não havia sobreviventes. Foi um terror. Cheguei a sentir o calor do fogo nas pernas. Se não tivesse sentido esse calor, não teria saído com tanta pressa.

Como testemunha e sobrevivente, tenho convicção de que o piloto salvou todos nós naquela manhã, passageiros e pedestres. Se ele movesse um grau para a esquerda ou direita no curso dos segundos finais do seu “pouso”, eu certamente não estaria aqui escrevendo este texto.

Minha irmã avisou o marido pelo telefone e, a cada vez que ela repetia a história, as lágrimas cobriam o seu rosto. Depois de uma hora aproximadamente, conseguimos chegar em casa. Fomos a pé, pois o trânsito estava congestionado no centro da cidade.

Em casa, sentada na cozinha e navegando nas redes sociais, percebemos o começo da repercussão do acidente. Víamos nossas imagens nos vídeos que viralizaram nas redes. O pânico foi maior, um segundo choque para nós três. O que parecia surreal se transformou em lembranças tristes registradas pelas câmeras da rua.

Como minha irmã mora em Ubatuba, passou a tarde respondendo mensagens de amigos e conhecidos que souberam da nossa presença no ocorrido. Meu cunhado nos reconheceu no vídeo e ficou bem aliviado quando nos viu chegar em casa.

Passamos o dia incrédulas com o ocorrido, sem entender o que havia acontecido. Com um sentimento de perda, uma estranheza difícil de descrever em palavras.

Acompanhar notícias de desastres é algo que nos comove, mas fazer parte daquilo e ter a vida cruzada pela fatalidade de uma tragédia é algo perturbador. Ficamos aliviadas em saber que os quatro passageiros foram resgatados com vida. Mas lamentamos que o piloto não tenha resistido aos ferimentos. Ele faleceu depois de ser retirado das ferragens.

Só com este texto, parei para expurgar o sentimento e a angústia de ver um acidente pelo lado de dentro da história. Não consegui exercer meu lado jornalista, pois a experiência de ver aquele veículo crescendo como se fosse um filme 3D diante dos meus olhos é uma cena que nunca vai sair da minha mente.

Ter a vida atravessada e ameaçada por um acidente faz cruzar uma linha tênue entre a vida e a morte. A partir de agora, nove de janeiro será um segundo aniversário para mim, minha sobrinha e minha irmã.


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