Em dezembro, com o Liverpool perto de uma vitória que aumentou a vantagem na liderança da Premier League, torcedores resolveram provocar o treinador rival. O canto, popular na Inglaterra, tem a melodia de “Guantanamera” e diz: “Sacked in the morning, you’re getting sacked in the morning” ou “você vai ser demitido amanhã de manhã.” O alvo era Pep Guardiola.
O treinador do Manchester City sorriu e fez o número seis com os dedos —os títulos do Campeonato Inglês que conquistou desde que assumiu, em 2016.
O City não tem chance de vencer a Premier League e, com uma equipe envelhecendo e com lesões, faz temporada irreconhecível para seus padrões. O golpe final foi a eliminação nesta semana na Liga dos Campeões para o potente Real Madrid. Mas Guardiola ser demitido, só em brincadeira de torcida mesmo.
Não é só porque ele tem crédito pelo que conquistou. É porque, fosse em outras ligas europeias, ou no Brasil, talvez nem um dos melhores técnicos de todos os tempos sobreviveria.
O tom da imprensa inglesa sobre a duração dos treinadores da Premier League é sempre de preocupação. “Nunca se demitiu tanto”, dizem as manchetes. Mas é questão de perspectiva.
Segundo reportagem do The Athletic de maio de 2024, o tempo médio de um técnico no Campeonato Inglês no cargo é de 787 dias. Guardiola está há oito anos e meio e é o mais longevo no momento. Thomas Frank segue há pouco mais de seis no Brentford, e Mikel Arteta está há cinco no Arsenal.
Isso sem contar os lendários Sir Alex Ferguson, no Manchester United por 21 anos, e Arsène Wenger, que comandou o Arsenal por 22. O time de Londres é o que menos trocou técnicos desde a criação da Premier League, em 1992 –cinco vezes. Em 133 anos de história, o Liverpool só teve 22 treinadores.
Claro que há exceções. Chelsea e Tottenham têm péssima reputação, com 18 técnicos cada um nas 33 temporadas da liga. Mas, no geral, a tendência é dar tempo ao treinador para que implemente suas ideias. Existe paciência e planejamento.
Há alguns dias, o repórter Fred Caldeira, da TNT Sports, perguntou a Guardiola o que ele achava de 20 técnicos terem sido demitidos em clubes do Brasileirão em 2024.
Espantado, respondeu: “Não sei a razão pela qual isso acontece, mas os clubes também precisam pensar que, quando vivem uma temporada com três ou quatro treinadores diferentes, o problema é quem escolheu esses treinadores. Então deveriam demitir os dirigentes que os escolheram”. E completou: “No meu primeiro ano, eu não ganhei. Se tivessem me demitido, não teríamos vivido os oito, nove anos como vivemos. Agora, não me demitiram nesta temporada porque ganhamos muito no passado”.
Faz sentido. Em seu primeiro ano, o City foi eliminado da Liga dos Campeões nas oitavas de final para o Mônaco, saiu da Copa da Inglaterra na semifinal e foi terceiro na Premier League, 15 pontos atrás do campeão, Chelsea. Não conquistou nada. Se dirigentes e torcida tivessem sido impacientes, os seis títulos da liga, o da Champions e o Mundial de Clubes, entre outros, provavelmente não existiriam.
“As coisas não são eternas”, admitiu o espanhol depois da melancólica eliminação nesta semana. Mas nenhum time, por mais rico que seja, prospera sem um ingrediente chave nesta receita de sucesso: estabilidade.
Todas
Discussões, notícias e reflexões pensadas para mulheres
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.